Como a polícia chegou aos suspeitos do assassinato de Marielle Franco


Época - "É inconteste que Marielle Francisco da Silva foi sumariamente executada em razão da atuação política na defesa das causas que defendia. A barbárie praticada na noite de 14 de março de 2018 foi um golpe ao estado democrático de direito", afirmaram as promotoras Simone Sibilio e Leticia Emile na denúncia contra Ronnie Lessa e Elcio Vieira de Queiroz por envolvimento no assassinato da vereadora.

A polícia demorou meses para chegar ao nome de Ronnie Lessa, 48 anos, sargento reformado da Polícia Militar. O nome de Lessa, que mora no mesmo condomínio de classe média alta que o presidente Jair Bolsonaro, o Vivendas da Barra, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro, foi aventado a partir de informações recebidas pela polícia de dentro e de fora de presídios.

A principal prova colhida pelos investigadores é fruto da quebra do sigilo de dados digitais de Ronnie Lessa. Ao verificar os arquivos acessados por Lessa via celular antes do crime, armazenados na “nuvem” (guardados em servidor externo que permite que sejam vistos remotamente), descobriu-se que o suspeito monitorava o cotidiano de Marielle, inclusive sua agenda de eventos. Um dos locais ligados à vereadora pesquisados foi um antigo endereço dela, quando ainda morava na Rua do Bispo, na Tijuca. Para a polícia, esse é um indício fundamental de que os passos de Marielle estava sendo rastreados. Marielle, segundo a investigação, participou de pelo menos um dos eventos pesquisados pelo suspeito.

Segundo investigadores, Lessa utilizava um celular comprado no CPF de um terceiro. O aparelho que estava registrado sob seu cadastro foi utilizado no mesmo dia dos assassinatos de Marielle e Anderson Gomes, na Zona Sul do Rio.

Já Elcio Queiroz, apontado como o motorista no dia do assassinato e preso nesta manhã, foi identificado, segundo a Delegacia de Homicídios, como motorista de escolta de cargas, já apresentando experiência para a função.





O ex-PM Elcio Vieira de Queiroz é acusado de ter dirigido o carro usado no crime Foto: Reprodução

Marielle e Anderson foram mortos em 14 de março de 2018, quase um ano atrás, na Rua João Paulo I, no bairro do Estácio, Zona Norte do Rio. Segundo a PM, Lessa teria atirado nas vítimas e Elcio teria dirigido o Cobalt prata usado na emboscada.

Com a troca dos celulares, o suspeito tentava enganar a polícia, caso os agentes verificassem as antenas de telefonia para checar se Lessa estaria no local do crime naquele momento.

Por vários meses, os policiais da área de tecnologia da Delegacia de Homicídios trabalharam na pesquisa, reduzindo o número de aparelhos investigados. Baseados numa imagem de câmaras de segurança da Rua dos Inválidos, no centro do Rio, no dia 14 de março, os investigadores registraram os horários em que um suposto celular aparece com a tela ligada dentro do Cobalt prata dos executores. O carro deles estava estacionado perto da Casa das Pretas, onde Marielle participava como mediadora de um debate.

A partir do horário que o aparelho estava possivelmente em uso, os investigadores fizeram uma nova triagem na lista de celulares até descobrir que um desses telefones fez contato com uma pessoa relacionada à Lessa. Desse ponto, a polícia trabalhou para buscar os dados na nuvem do policial.

A operação Lume, deflagrada nesta quarta-feira e que levou à prisão de Ronnie Lessa e Elcio Queiroz, além de estar fundamentada na interceptação dos dados digitais do suspeito, também se sustenta em depoimentos de informantes, inclusive presos no sistema carcerário. Após quase 12 meses de investigação, polícia e o Ministério Público do Rio concordaram em desmembrar o inquérito em duas partes para não perder mais tempo. Uma das partes foi transformada em denúncia, identificando os atiradores. A outra, ainda em andamento, está focada em encontrar os mandantes do crime — que ainda não foram identificados. Apesar da prisão de Ronnie Lessa e Elcio Queiroz, a Polícia tem a certeza de que um terceiro homem estava dentro do Cobalt que alvejou o carro de Marielle e Anderson.Histórico de atentados: Ronnie Lessa, o sargento reformado indicado pela polícia como principal suspeito Foto: Editoria de Arte


ATENTADO CONTRA LESSA

Em 27 de abril do ano passado, Lessa sofreu um atentado. Ele e um amigo, bombeiro, foram baleados no Quebra-Mar, na Barra da Tijuca. Um motociclista teria abordado o carro em que eles estavam. Lessa e o amigo, militares, reagiram e balearam o homem, que fugiu. À época, a Polícia Civil informou que não descartava nenhuma hipótese para o crime, mas que considerava como a principal linha de investigação uma tentativa de assalto. Lessa foi obrigado a entrar com um boletim de ocorrência, porque foi baleado e levado ao Hospital Municipal Lourenço Jorge, também na Barra da Tijuca. A cadeia de eventos também chamou a atenção dos investigadores que trabalhavam no caso Marielle.

Essa não é a primeira vez que Lessa aparece no noticiário. Em 2009, ele foi vítima de um outro atentado, em Bento Ribeiro. Uma bomba explodiu dentro de seu carro, um Toyota Hilux blindado. Ele perdeu uma das pernas no crime e, desde então, utiliza uma prótese.

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